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CORPO DE MULHER*

Cristiana Gallo

Nada de novo sob o sol.”

 

Esta foi a frase de um estudante do curso de Enfermagem da USP-RP ao final do Cinecult¹ de 12/08/2015, que teve a exibição do filme Acusados, estrelado por Jodie Foster em 1988.

 

Com isto ele pretendia transmitir ao que de fato assiste em seu trabalho no que se refere à revitimização das pessoas atendidas na rede de saúde, quando não recebem o devido acolhimento após uma situação de violência. Mas, para além desse momento inicial, Heloísa Buarque de Almeida já nos informava que o filme trazia uma perspectiva diversa do caso brasileiro em termos das efetivas consequências jurídicas em relação aos autores de crimes sexuais.

As contribuições da Profa Heloísa, pesquisadora preocupada com os fenômenos da violência que atinge mulheres, mas também negros, transexuais, homossexuais…, nos permitiram reconhecer um avanço na colocação do problema ao abordá-lo no interior da universidade, onde tais fenômenos ocorrem entre alunos e entre alunos e professores. Indicou-se que se trata de promover um avanço no discurso, mas com incidência nas práticas, atingindo o campo jurídico das leis. Entretanto, para ela, tal avanço se colocaria em termos geracionais: uma aposta nos jovens!

De fato, aconteceu uma intensa conversa após o filme, que foi exibido nas dependências da Faculdade de Direito, com contribuições dos alunos de Direito, Medicina, Enfermagem. Contou-se ainda com os aportes da Profa Heloísa e a interlocução que se abriu entre a sociologia/antropologia e a psicanálise, a partir da presença de Paola Salinas e da coordenação de Eduardo Benedicto.

 

Após localizar a emergência da violência focada nas minorias na universidade – o que, nos dizeres da pesquisadora, envolve raça, gênero e classe social –, a conversa deixou evidente o que transita no discurso de alunos e docentes e explicita tal violência que por vezes irrompe em atos com graves consequências para todos os envolvidos. O que se fez perceber é que o óbvio precisa ser dito e repetido, a fim de adquirir corpo e existência: existência de espaços de escuta e encaminhamento das situações vividas: vividas de forma violenta.

Destacando-se o tema “Corpo de Mulher”, que para nós adquire maior importância rumo às próximas Jornadas da EBP-SP, a interlocução entre o campo social e o da

psicanálise trouxe o que para o primeiro se coloca como “corpos de mulheres” e para a segunda apresenta-se no singular.

 

“Corpos de mulheres” nos coloca no intrincado, necessário, urgente, campo das políticas públicas, permitindo-nos reconhecer o que já foi obtido enquanto importantes conquistas sociais e jurídicas, ao mesmo tempo em que ainda parece tão preliminar ao nos aproximarmos cada vez mais da questão.

ocê contar sua história e para que seus visitantes saibam um pouco mais sobre você.

Ao abordar mais de perto a questão no singular, Paola nos lembra que ao psicanalista cabe tratar “o resto”, o que não encontrará razão ou encaixe em nenhuma política pública: aquilo que caminha contrário ao bem comum e ao bem de cada um.

 

Estamos, assim, num dos eixos de nossa pesquisa em direção às próximas Jornadas da EBP-SP ao tratarmos da “violência e dos atentados contra as mulheres e seus direitos hoje”.

 

Destaco o que pode ser colhido nesta atividade enquanto experiência da escuta de mulheres na via contrária à da segregação, na qual se colocou a possibilidade da responsabilização de um falasser pelo seu próprio gozo. Nesta medida, apontou-se para situações que envolvem repetidas vitimizações, entendendo-se que a política pública do acolhimento, dissociada dessa escuta singular, pode fracassar.

 

Nesse sentido, as indicações trazidas para a conversa a partir da psicanálise sinalizaram para a impossibilidade da abordagem de “todas as mulheres vítimas”, ao mesmo tempo em que foi destacado o risco da exclusão do singular no movimento de forçamento de uma medida universal; apontou-se para a abordagem das mulheres “uma a uma”, no interior dos serviços que se fazem responsáveis por tal atendimento.

 

1 O Cinecult é uma realização da PUSP-RP (Prefeitura do Campus USP de Ribeirão Preto) tendo o Clin-a (Centro Lacaniano de Investigação sobre a Ansiedade) como um dos seus apoiadores. Nesta ocasião, a EBP-SP também participou da atividade, por se tratar de uma etapa preparatória para as Jornadas da EBP-SP 2015 – Corpo de Mulher, trazendo pontuações de Paola Salinas (EBP/AMP) ao lado da apresentação da Profa. Dra. Heloísa Buarque de Almeida, docente do departamento de Antropologia da FFLCH-USP.

* Atividade preparatória para a Jornada Clínica da EBP-SP

 

** Membro da EBP/AMP

 

OBS: O texto em pauta foi publicado no DR 14 (Diretoria na Rede) , sob a rubrica "EBP Acontece",

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